Pessoas com personalidade de autoconflito, independente de terem ou não diagnóstico de transtorno de personalidade, são pessoas que possuem um senso de merecimento inflado. Elas acreditam que as regras são apenas para os outros e que, simplesmente, não se aplicam a elas. Sentem-se mais importantes que qualquer um e acham que só têm que fazer aquilo que querem.
É assim que essas personalidades se colocam no mundo: como se nós tivéssemos obrigação de fazer o que eles querem, na hora que querem e que as regras que existem no mundo, não são feitas para eles.
E é claro que nossa convivência com gente assim vai apresentar alguns efeitos colaterais. Quando falo “nossa convivência”, me refiro a nós que trazemos algum tipo de trauma de abandono ou de não merecimento. Ou a “nós” que viemos de lares visivelmente abusivos e de fato trazemos a chaga de sermos filhos de pai ou mãe narcisista.
Ao conviver com personalidades de autoconflito sentimos um monte de respostas emocionais fortes. E o que acaba acontecendo é que não bancamos essas respostas emocionais e sucumbimos, fazendo o que a personalidade de autoconflito quer.
Para não entrarmos numa bolha de auto sacrifício e auto anulação (que nos deixa péssimos e morbidamente fragmentados), a única saída é não ceder aos favores que eles cobram. Em outras palavras, precisamos bancar a punição.
Precisamos nos manter lúcidos conforme atravessamos o fogo (porque sim, vamos precisar atravessar o fogo). E mais do que isso, vamos ter que ouvir e atender o que nossa bússola interna está pedindo. (Nossa bússola interna fala baixinho, sussurrando e precisamos ficar em silêncio para ouvi-la). Mas teremos que bancar isso se quisermos mesmo seguir nossa verdade. É isso ou voltar para o ciclo de abuso.
Mudar a maneira de se portar perante uma personalidade exigente e conflituosa, é a única forma de viver uma vida com autonomia e leveza. Pela minha experiência (e eu aprendi alguma coisa sendo filha mãe narcisista), podemos fazer essa mudança passo a passo, um pouquinho por dia, sem precisar tomar grandes decisões mirabolantes. A gente dá uma resposta diferente para essa pessoa, algo que siga a nossa necessidade e não a dela. E isso vai incomodar bastante (a nós principalmente). Porém, nos mantendo firmes e nos acolhendo de forma incondicional, abraçando mentalmente nossa criança, a gente consegue sim.
Precisamos saber que bancar nossa verdade interna, seguir nossa bússola, vai nos exigir coragem para bancar as tempestades de fogo e punição que certamente virão. Quando decidimos sair da bolha de encolhimento que nos metemos para agradar essas “personalidades exigentes”, precisamos ter em mente que estamos nos preparando para uma guerra. Sim, porque sofreremos punição de alguma forma. Se a gente começa já sabendo disso e se munindo internamente, fica mais fácil (ou menos terrível).
Na minha jornada de libertação já caí muitas vezes mas a cada vez que me levanto, vou ficando mais forte, mais astuta e treinada. E toda vez que me deparo com esse tipo de personalidade, imediatamente aciono meu circuito de vigilância, me armando de lucidez e me apropriando de mim mesma, me revestindo com a armadura da consciência.
Claro que evito o máximo dialogar com esse tipo de gente, mas se não tenho outra escolha, aciono todo esse mecanismo no intervalo de tempo de uma respiração profunda e aí vou em frente. Mantenho a seriedade, economizo sorrisos já sabendo que eles vão armar ciladas o tempo todo, vão tentar apertar meus botões, vão fazer jogo de inversão e usar violência passiva. Com cara de paisagem, vou pulando e me esquivando como num videogame, mantendo a calma e a atenção. Na primeira brecha, digo que estou atrasada e saio dali o quanto antes.
Nunca é demais lembrar que não podemos nos demorar junto a essas pessoas sob o risco de deixarmos nossa sanidade abalada e nos intoxicarmos energeticamente. Esse tipo de gente possui uma mentalidade invertida e uma energia perversa que, de verdade, causa dano.
Durante a conversa, não esmoreça. Se atacarem, não revide. Seja firme na sua fala, economize nas palavras e desvie dos fios desencapados. Tente ser desinteressante. Não fale de você, muito menos sobre seus planos e metas. Deixe eles falarem, dê respostas evasivas e saia. Sim, saia dali o quanto antes e acredite: com o tempo você vai se capacitar cada vez mais na arte de lidar (ou de se esquivar), de personalidades de autoconfito. Afinal, o ideal mesmo é não ter que se relacionar com eles e sim, saber “lidar” para conseguir “pular fora”.